Revista Iberoamericana de Derecho, Cultura y Ambiente
RIDCA - Edición Nº5 - Derecho de Familia y Sucesiones
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15 de julio de 2024
A Revolução da Telemedicina no Contexto Familiar: Facilitando o Cuidado à Pessoa Idosa no Brasil.
La revolución de la telemedicina en el contexto familiar: facilitando la atención a los ancianos en Brasil
Autoras. Marcela Mª Furst Signori Prado y Patrícia Landers. Brasil
Por Marcela Mª Furst Signori Prado[1] y Patrícia Landers[2]
INTRODUÇÃO
Pessoa idosa é considerada pela Lei nº 10.741/03 – o Estatuto da Pessoa Idosa -, aquelas pessoas com idade igual ou superior a 60 anos de idade.
O envelhecimento e o estado de vulnerabilidade da pessoa idosa é inevitável, por isto, a Constituição Federal Brasileira de 1988 já traz a proteção aos idosos, e o Estatuto do Idoso veio como uma regulamentação dos direitos e garantias já ali previstos.
Muitos idosos fragilizados em sua condição física, passam a vivenciar o demérito de sua família com os cuidados com sua saúde, que alegam falta de tempo para acompanhar a pessoa idosa em clínicas e consultórios médicos.
A relação médico-paciente sempre foi baseada no contato físico, onde, na maioria das vezes, o paciente dirigia-se até o consultório do médico, e após a finalização da consulta, além das orientações médicas, recebia receituários, atestados, relatórios, dentre outros documentos, todos por escrito.
Diante da crise sanitária vivida no mundo todo, a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 11 de março de 2020, declarou estado de pandemia em decorrência das infecções pelo Coronavírus. Com a referida crise, a população mundial passou a viver sob as regras do distanciamento, motivo pelo qual a relação médico-paciente necessitava de alternativas para o enfrentamento da nova realidade.
Assim, o atendimento médico através da telemedicina passou a ser uma necessidade, e é importante esclarecer que mesmo antes da pandemia, o Conselho Federal de Medicina (CFM) já havia discutido a possibilidade da prática do exercício da medicina através da telemedicina, tendo sido disciplinada por meio da Resolução CFM 1.643/2002.
Surge assim, um facilitador ao acompanhamento dos familiares com os cuidados com a pessoa idosa.
DESENVOLVIMENTO
A Constituição Federal Brasileira assim determina (grifos nossos):
“Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.”
E o Estatuto da Pessoa Idosa assim determina (grifos nossos):
“Art. 2º A pessoa idosa goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar à pessoa idosa, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.”
Fato é que, vivemos em uma sociedade com pressa e cheias de compromissos. E as famílias não estão preparadas para o envelhecimento.
O processo de envelhecimento impõe diversas limitações aos indivíduos, reduzindo sua mobilidade e desacelerando suas atividades cotidianas. À medida que os anos avançam, as pessoas tendem a realizar tarefas de forma mais lenta e a enfrentar um aumento na incidência de problemas de saúde. Entretanto, a sociedade moderna, caracterizada por um ritmo de vida acelerado, muitas vezes não acolhe de forma adequada o envelhecimento de seus pais.
Esse descompasso gera uma dificuldade crescente para os familiares em equilibrar o cuidado dos idosos com suas próprias responsabilidades diárias.
Como falado, diante da crise sanitária vivida no mundo todo em decorrência das infecções pelo Coronavírus, em 2020, a população mundial passou a viver sob as regras do distanciamento. Assim, o atendimento médico através da telemedicina passou a ser uma necessidade
É importante destacar, que mesmo antes da pandemia, o Conselho Federal de Medicina do Brasil (CFM),já havia discutido a possibilidade da prática do exercício da medicina através da telemedicina, tendo sido disciplinada por meio da Resolução CFM 1.643/2002.
A resolução CFM 1.643/2002 define a telemedicina como:
“O exercício da Medicina através da utilização de metodologias interativas de comunicação áudio-visual e de dados, com o objetivo de assistência, educação e pesquisa em Saúde.”
Portanto, por mais que estivéssemos vivendo em um mundo eminentemente globalizado, e por consequência, tecnológico, as questões éticas e legais em relação ao atendimento à distância ainda eram discutidas de forma muito tímida.
A telemedicina ainda caminhava de forma bem tímida, sendo alvo de inúmeros questionamentos, os quais ocasionaram a revogação da Resolução CFM 1.643/2002, e em razão disto, outra resolução sobre telemedicina foi publicada, a Resolução CFM 2.227/18, que definia e disciplinava a telemedicina como forma de prestação de serviços médicos mediados por tecnologias.
Acontece, porém, que a Resolução CFM 2.227/18 não se manteve em vigor por muito tempo, vindo também a ser revogada, motivo pelo qual a antiga resolução – Resolução CFM 1.643/2002 -, sob o instituto da repristinação, passou a ter validade novamente, estando em vigor até a presente data.
Assim, a primeira resolução, que detinha menos detalhes em relação ao uso da telemedicina, voltou a ter vigência. Mas, o que não se esperava, era o surgimento de uma pandemia, que devastaria o mundo. E para medidas urgentes, necessita-se de decisões urgentes, momento em que foi necessário evidenciar e disciplinar o uso da telemedicina como uma ferramenta extremamente importante para uma realidade em que a recomendação era manter o distanciamento.
Neste ínterim, em meio aos desafios da pandemia, e sabendo-se que o Brasil não possuía uma regulamentação especifica para o uso da telemedicina, a coordenadoria jurídica do Conselho Federal de Medicina do Brasil (CFM) emitiu o Ofício CFM n.º 1.756/2020 – COJUR, de 19 de março de 2020, em caráter de excepcionalidade, reconhecendo a possibilidade e eticidade do uso da telemedicina, para além do que estava disposto na resolução vigente, a qual disciplinava superficialmente sobre o tema.
O referido ofício trouxe a possibilidade de teleorientação, em que os pacientes poderiam receber orientações à distância; telemonitoramento, em que os pacientes seriam monitorados à distância para averiguação da saúde e da doença; teleinterconsulta, a possibilidade de troca de informações e opiniões entre os médicos por meio do uso da tecnologia.
E desta maneira, em meio à tamanha urgência, logo após o envio do ofício CFM n.º 1.756/2020, o Ministério da Saúde publicou a Portaria n.º 467, de 20 de março de 2020, regulamentando as medidas de enfrentamento de saúde pública, com o objetivo de reduzir a circulação de pessoas.
De acordo com a portaria, as ações de telemedicina consistiam em: atendimento pré-clínico, de suporte assistencial, de consulta, monitoramento e diagnóstico, realizados através de tecnologia da informação e comunicação, podendo ser aplicado no âmbito do SUS, na saúde suplementar e privada.
E, frente à crise sanitária vivida no mundo em razão da pandemia da Covid-19, a telemedicina que caminhava a passos lentos no âmbito do Conselho Federal de Medicina e do Poder Legislativo, tornou-se uma das armas mais potentes contra o coronavírus, pois, uma das maiores necessidades da população naquele momento era preservar a saúde evitando o contato físico, e isto só foi possível, dentre inúmeras ações preventivas, com a aplicação das teleconsultas, isto é, quando os casos eram mais leves e sem necessidade de intervenção médica direta.
Logo, percebe-se que em curto espaço de tempo se avançou e muito no que diz respeito à telemedicina, sendo essencial para o momento em que estávamos vivendo (pandemia Covid-19), e se tornou uma realidade contemporânea, que necessita de maior regulamentação pelos órgãos responsáveis na busca de dimensionar os seus aspectos positivos e negativos, implementando as regras, bem como as medidas de fiscalização a serem aplicadas.
A verdade é que o avanço tecnológico imergido no setor da saúde, mais especificamente com a telemedicina, fez com que várias facetas da medicina passassem a ser executadas telepresencialmente, o que torna a telemedicina um fato, não havendo a possibilidade de se voltar atrás.
Tanto é fato que foi sancionada a lei da telessaúde, Lei 14.510/2022, que alterou a Lei 8.080/1990, a atualizando e inserindo novos conceitos sobre o uso da tecnologia por profissionais de saúde, autorizando e disciplinando a telessaúde em todo o território nacional.
Vejamos a definição de telessaúde, no art. 26-C da Lei 14.510/2022 (grifos nossos):
“Art. 26-B. Para fins desta Lei, considera-se telessaúde a modalidade de prestação de serviços de saúde a distância, por meio da utilização das tecnologias da informação e da comunicação, que envolve, entre outros, a transmissão segura de dados e informações de saúde, por meio de textos, de sons, de imagens ou outras formas adequadas.”
Assim, com a possibilidade de realizar atendimentos de forma remota, a telemedicina permite que os familiares, mesmo com suas agendas ocupadas, possam participar ativamente do cuidado e monitoramento da saúde das pessoas idosas. Dessa maneira, os familiares cumprem a obrigação legal de cuidado e proteção, assegurando que as pessoas idosas recebam a atenção necessária e estejam acompanhados sem haver a necessidade de deslocamento, o que torna mais confortável o atendimento.
CONCLUSÃO
Conclui-se que com a pandemia da Covid-19, foi necessária adequação no formato de atendimento médico-paciente, aplicando-se a estes atendimentos a tecnologia através de ferramentas disponibilizadas na internet, o que se mostrou bastante vantajoso e confortável para os médicos e pacientes, trazendo à tona uma realidade que ainda era muito distante, mas que com a necessidade do momento, se transformou rapidamente em uma rotina do dia a dia, a qual continua progredindo, comprovando que a telemedicina é um fato.
Portanto, este fato já se internalizou na sociedade brasileira, bem como entre as famílias, que muitas vezes não estão preparadas para o envelhecimento de seus entes queridos, pois, os pais e mães que antes cuidavam, agora necessitam ser cuidados pelos filhos.
É imprescindível que haja uma estrutura familiar adequada e equilibrada, fundamentada no afeto, para garantir uma convivência familiar saudável e os cuidados necessários; assegurando os direitos constitucionais essenciais aos idosos, de serem cuidados e protegidos na velhice.
Assim, a evolução tecnológica da telemedicina trouxe significativas facilidades para as famílias no acompanhamento de seus familiares idosos, às quais podemos mencionar: acessibilidade geográfica, conveniência e flexibilidade, redução do tempo de espera, economia de tempo e dinheiro, acesso aos especialistas, continuidade do cuidado, menor risco de exposição às doenças, documentação e registro eletrônico.
Desta forma, a telemedicina está revolucionando o acesso à saúde, tornando-a mais acessível, e os familiares podem participar das consultas médicas, auxiliando na comunicação e garantindo que as recomendações médicas sejam compreendidas e seguidas. Além disso, é possível garantir o acesso à saúde até mesmo para aqueles idosos que moram em localidades muito distantes, o que representa um avanço significativo na assistência à saúde dos idosos, oferecendo um atendimento conveniente e seguro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Estatuto da Pessoa Idosa: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm Acessado em 05/07/2024.
Constituição Federal Brasileira:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Acessado em 05/07/2024.
Resolução CFM 1.643/2002: TERMO DE ATESTO – 1643_2002.pdf (cfm.org.br) Acessado em 26/11/2023.
Resolução CFM 2.227/18: TERMO DE ATESTO (cfm.org.br) Acessado em 06/12/2023.
Ofício CFM n.º 1.756/2020: telemedicina.pdf (cfm.org.br) Acessado em 06/12/2023.
Portaria nº 467-20-ms (planalto.gov.br) Acessado em 06/12/2023.
Lei 14.510/2022: L14510 (planalto.gov.br) Acessado em 27/01/2024.
Citas
[1] Advogada especialista em Direito de Família. Conselheira Seccional da OAB/DF. Presidente da Comissão de Direito Sistêmico da OAB/DF. Membro Consultora da Comissão Especial de Direito de Família do Conselho Federal da OAB. Conselheira Fiscal da Associação Brasileira de Mulheres em Carreiras Jurídicas – ABMCJ/DF. Membro do Instituto dos Advogados do Distrito Federal/IADF.
[2] Advogada especialista em Direito Médico e da Saúde, pós-graduanda em Direito Médico e Bioética pela PUC de Minas Gerais, pós-graduada em Direito Processual Civil, Presidente da Subseção da OAB de São Sebastião no Distrito Federal, membro da Comissão de Direito Médico do Conselho Federal da OAB.