Revista Iberoamericana de Derecho, Cultura y Ambiente
RIDCA - Edición Nº7 - Derecho Civil y Comercial
Marcela A. Menta. Directora
Marzo de 2025
A possibilidade de desfiliação biológica no Brasil.
La posibilidad de la desafiliación biológica en Brasil
Autora. Marcela Mª Furst Signori Prado. Brasil
Por Marcela Mª Furst Signori Prado[1]
INTRODUÇÃO
De acordo com a Constituição Federal Brasileira, a família é a base da sociedade e é dever da família, além da sociedade e do Estado, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Conforme Código Civil Brasileiro, a filiação prova-se pela certidão do termo de nascimento registrada no Registro Civil. E os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
O Estatuto da Criança e do Adolescente Brasileiro (ECA), prevê que aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores. Mãe e pai, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança.
Desconstituir uma paternidade não é fácil, pois há direitos e deveres inerentes.
DESENVOLVIMENTO
A paternidade gera direitos e deveres. O Código Civil Brasileiro assim determina:
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;
III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;
V – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;
VI – nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
VII – representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
Assim como a Constituição Federal Brasileira, o Estatuto da Criança e do Adolescente Brasileiro, prevê que é dever da família, não apenas da comunidade, da sociedade em geral e do poder público, assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
De modo que, o dever de cuidar é recíproco entre pai e filho. Os pais têm esta obrigação quando os filhos são crianças e adolescentes bem como os filhos têm a obrigação quando os pais são idosos.
Assim prevê a Constituição Federal Brasileira:
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.
O Código Civil Brasileiro ao tratar da pensão alimentícia, assim prevê:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
Porém, a ausência de vínculos entre pai e filho pode ocasionar intenso sofrimento psíquico para aquele filho.
O abandono paterno pode se dar de várias formas:
- a) material: quando o pai deixa de prestar assistência e por exemplo pagar alimentos ao filho. Está previsto no Código Penal, no capítulo “Dos crimes contra a assistência familiar” e o artigo 244 do código penal diz que é crime quando se deixa de prover, sem justa causa, a subsistência do filho menor de 18 anos, não proporcionando os recursos necessários.
- b) afetivo: é quando há a indiferença afetiva em relação ao filho, ainda que não exista abandono material.
Nos últimos anos o judiciário brasileiro têm reconhecido a possibilidade de exclusão do sobrenome paterno, em conformidade com o artigo 57 da Lei de Registros Públicos Brasileira (Lei 6.015/1973) quando há o abandono afetivo, por causar desconforto e sofrimento psíquico.
A 8ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios em sua decisão destacou que: “O abandono afetivo configura justo motivo capaz de admitir supressão do sobrenome paterno”.
Entretanto, muitas vezes, a mera retificação do nome para suprimir o sobrenome do genitor não é o suficiente. Em muitos casos, há a inexistência de vínculo afetivo desde a infância e o imenso desconforto pela falta de identificação entre pai e filho, além da ausência de sentimento familiar.
Assim, em 18 de fevereiro de 2025, em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça Brasileiro, STJ, no julgamento do REsp 2.117.287, manteve a desconstituição da paternidade requerida por um rapaz, para que constem em seu registro de nascimento apenas os nomes de sua mãe e dos avós maternos, bem como sejam extintos os deveres recíprocos – como os de natureza patrimonial e sucessória. Declarou a relatora do recurso, Ministra Nancy Andrighi:
«Constatada a inexistência de vínculo de socioafetividade entre o autor e seu genitor, bem como evidenciada a quebra dos deveres de cuidado do pai registral, consubstanciado no abandono material e afetivo do filho, verifica-se a possibilidade de rompimento do vínculo de paternidade, ante o descumprimento do princípio constitucional da paternidade responsável.»
CONCLUSÃO
É preciso entender que a desfiliação da parentalidade paterna é um direito existencial do filho e que deve ter o amparo jurídico.
O nome carrega a imagem e a personalidade da pessoa, para si mesma e perante a sociedade, além da sua história familiar.
Como diz Jones Figueirêdo Alves no seu artigo Desconstituições da filiação, em rupturas do vínculo paterno-filial: Efetivamente, “o que se pretende com o nome civil é a real individualização da pessoa perante a família e a sociedade” (STJ, 4ª Turma, REsp. nº 66.643/SP) e essa alteração condiz com a necessidade psicológica da supressão de patronímico por infortúnio.
No caso específico trazido acima, referente ao julgamento de 18 de fevereiro de 2025, da 3ª Turma do STJ no julgamento do REsp 2.117.287, também tem o fator externo de que o pai foi autor de um crime bárbaro e midiático, em que todos passaram a saber seu nome e sobrenome, causando assim, ao longo dos anos, constrangimento ao filho[2].
Cumpre esclarecer que, a mera condenação criminal não implica, por si só, na perda do poder familiar, a menos que o crime tenha sido cometido contra o próprio filho. Então quando um pai comete um crime e é condenado a muitos anos de prisão, a regra geral conforme o ECA, é a suspensão do poder familiar, e não a perda automática; o exercício do poder familiar pode ser suspenso quando há impossibilidade de cumprimento dos deveres parentais, como ocorre na prisão de longa duração.
Desconstituir uma paternidade não é fácil, pois há direitos e deveres inerentes, porém existe a possibilidade e cada caso deve ser visto na sua individualidade.
Há outras formas também de anulação de registro de paternidade, como diante de vício de consentimento, entretanto o presente trabalho se ateve à questão do abandono afetivo e a quebra dos deveres de cuidado do genitor com o filho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm Constituição Federal. Acesso em 11 de março de 2025.
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm Estatuto da Crianças e Adolescente. Acesso em 11 de março de 2025.
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm Código Civil. Acesso em 11 de março de 2025.
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm Código Penal. Acesso em 11 de março de 2025.
https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2024/junho/tribunal-reconhece-direito-de-mulher-em-excluir-sobrenome-de-pai-biologico-por-abandono-afetivo Acesso em 11 de março de 2025.
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015compilada.htm Lei de Registros Públicos. Acesso em 11 de março de 2025.
https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2025/18022025-Falta-de-vinculo-de-socioafetividade-leva-Terceira-Turma-a-manter-desconstituicao-de-paternidade.aspx Acesso em 11 de março de 2025.
https://ibdfam.org.br/artigos/1560/Desconstitui%C3%A7%C3%B5es+da+filia%C3%A7%C3%A3o%2C+em+rupturas+do+v%C3%ADnculo+paterno-filial Acesso em 11 de março de 2025.
[1] Advogada especialista em Direito de Família. Presidente da Comissão de Direito das Famílias da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional do Distrito Federal – OAB/DF. Membro do Comitê Científico de Direito Civil e Processo Civil do Instituto dos Advogados do Distrito Federal – IADF.
[2] https://ibdfam.org.br/artigos/1560/Desconstitui%C3%A7%C3%B5es+da+filia%C3%A7%C3%A3o%2C+em+rupturas+do+v%C3%ADnculo+paterno-filial
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