Revista Iberoamericana de Derecho, Cultura y Ambiente

Revista Iberoamericana de Derecho, Cultura y Ambiente
RIDCA - Edición Nº3 - Derecho Ambiental

Mario Peña Chacón. Director

15 de julio de 2023

Os desafios na proteção ambiental rumo a sustentabilidade e a decolonialidade.
Los desafíos en la protección ambiental hacia la sustentabilidad y la decolonialidad

Autor. Fabiano Henrique de Oliveira. Brasil

Por Fabiano Henrique de Oliveira[1]

 

Resumo: O artigo trata de uma análise crítica sobre os debates internacionais que discutem questões ambientais, com foco na sustentabilidade. Problematiza-se se é possível diante da análise de dos mecanismos de proteção ambiental no âmbito mundial dizer que as discussões estão progredindo no sentido de promover e realizar um mundo sustentável? Ou ainda os interesses privados se sobrepõem ao coletivo?  Ainda é possível se pensar em um novo paradigma de sustentabilidade e equilíbrio entre o homem e a natureza? Em geral, objetiva demonstrar quais são os legítimos interesses dos mecanismos de proteção mundial na questão ambiental. E se esses instrumentos conjuntos de se pensar a crise ambiental são realmente efetivos ou se a vida sustentável precisa ser estruturada de uma outra maneira que não seja através do antropocentrismo. Nessa linha, o que a decolonialidade pode contribuir e nos ensinar para o regate da sustentabilidade. A metodologia adotada traz o método híbrido, dedutivo e decolonial como forma de descortinar a forma de produção de conhecimento científico baseado no padrão eurocentrado, não situado, objetivo, neutro do conhecimento.

 

 Palavras-chave: Biodiversidade; Desenvolvimento; Decolonialidade; Sustentalidade; Natureza.

 

1.   INTRODUÇÃO

 

O artigo tem como como núcleo a análise sob um olhar crítico sobre questões ambientais, assim como trazer como se está a tratar do tema da sustentabilidade, desenvolvimento, desigualdades, estratégias de proteção, diretrizes para assegurar gerações presentes e futuras um meio ambiente sadio e equilibrado. Ainda busca propor a decolonialidade da natureza sob o foco da ecosofia andina e o viver bem dos povos andinos de forma a demonstrar que se faz possível a mudança paradigma para a coexistência, respeito, reconhecimento e de interação entre humanos e natureza.  

Nesse sentido, problematiza-se: é possível diante da análise de dos mecanismos de proteção ambiental no âmbito mundial dizer que as discussões estão progredindo no sentido de promover e realizar um mundo sustentável? Ou ainda os interesses privados se sobrepõem ao coletivo?  Ainda é possível se pensar em um novo paradigma de sustentabilidade e equilíbrio entre o homem e a natureza?

Frente a problematização, o estudo tem como objetivo demonstrar quais são os legítimos interesses dos mecanismos de proteção mundial na questão ambiental. E se esses instrumentos conjuntos de se pensar a crise ambiental são realmente efetivos ou se a vida sustentável precisa ser estruturada de uma outra maneira que não seja através do antropocentrismo. Nessa linha, o que a decolonialidade pode contribuir e nos ensinar para o regate da sustentabilidade.

Os objetivos específicos da pesquisa é: (a) verificar a trajetória do paradigma de desenvolvimento sustentável: noções, trajetória e limites de uma forma crítica e de apontamentos; (b) analisar alternativas decoloniais que visem a sustentabilidade, pautando-se no conhecimento dos povos andinos para a busca de uma ecosofia e do viver bem. 

Nesse sentido, utiliza-se de um método híbrido, dedutivo e decolonial para se chegar a uma epistemologia de fronteira ou inter-epistemologia, pois a pesquisa tem como alvo desconstituir a forma de produção padrão, eurocentrada, não situada, objetiva, neutra do conhecimento. Para demonstrar que existe outras formas de epistemologias que são conhecimento científico, mas que por causa da colonialidade foi retirada do campo da ciência. A epistemologia de fronteira é aberta, pois ela agrega tanto as epistemologias modernas como as outras formas de pensamento renegados pela epistemologia hegemônica.

 

2.   PARADIGMA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: NOÇÕES, TRAJETÓRIA E LIMITES.

 

A terra, o mar, o ar e os seres vivos constituem-se em um complexo autopoiético que interatuam dinamicamente no tempo e espaço em um sistema de mútua dependência e capacidade regenerativa para o seu funcionamento constante e equilibrado.

Nesse contexto, é preciso observar e refletir sob o enfoque de tempo e espaço como as atividades humanas interferem na natureza, no conjunto de condições necessárias para possibilitar a vida, como afetam a vida de seres humanos e não humanos e verificar como, onde e quando tais atividades trazem significativos impactos ambientais com afetação ao bem-estar, promoção de desigualdades, sujeição e destruição da vida.

Ademais, se constatarmos que os seres humanos são somente um dos fios que compõe a diversidade de elos da teia da vida, e que há um potencial grau de destruição da natureza pelas atividades humanas. Também é preciso asseverar que há um alto grau de responsabilidade humana para a manutenção do equilíbrio desse sistema vivo, um dever de evitação de externalização de danos nos diferentes espaços e uma exigência ética de preservar as condições desses ambientes para as gerações futuras.

A relação entre afetação do meio ambiente decorrente das atividades humanas (crescimento, produtividade e consumo) e previsibilidade responsável levou ao surgimento de fórmulas jurídicas e econômicas de atenuação da degradação ambiental e proteção de determinados ecossistemas. Conservacionismo, decrescimento, ecodesenvolvimento, desenvolvimento sustentável, enfoque ecossistêmico do desenvolvimento foram algumas fórmulas.

O conceito vigente atualmente na legislação brasileira e adotada por uma série de tratados internacionais do qual o Brasil faz parte é o de desenvolvimento sustentável. Por isso, é importante verificar as noções gerais desse conceito, os elementos, a multiplicidade aberta, a extensão, o âmbito de proteção, a relação histórica de consagração, os limites, as críticas e as alternativas pós desenvolvimentistas.

Primeiramente se identifica que a noção de desenvolvimento sustentável é multiplamente aberta de compatibilidade entre dois elementos conceituais relativamente autônomos: sustentabilidade e desenvolvimento.

A sustentabilidade possuí critérios de análise inter-relacionados. Primeiro se verifica na análise de ações humanas e seus efeitos no tempo (presente e futuro). Depois se analisa o prognóstico, ou seja, que efeitos continuarão e quais as consequências de sua duração.

A este paradigma temporal é possível agregar os efeitos nos diferentes espaços, a desigualdade provocada pela ação humana que externaliza danos para fora do seu habitat de vivência, utilização e necessidades. E no prognóstico se analisa se os efeitos se multiplicarão, se intensificarão e se expandirão continuamente diante da fratura da equidade espacial.

A sustentabilidade pode ser vista também sob três enfoque: a sustentabilidade ambiental, a sustentabilidade econômica e a sustentabilidade social. Na sustentabilidade ambiental se avalia: a) o tempo e o espaço; b) a duração dos efeitos; c) a consideração do meio ambiente em relação ao presente e o futuro e aos diversos espaços. Está conectada a equidade intergeracional e espacial.[2]

A sustentabilidade econômica evoca a pertinente ponderação entre eficiência e equidade, isto é, a uma razoabilidade fundamentada em todos os empreendimentos, dos benefícios e dos custos diretos e indiretos (externalidades e afetação negativa sobre terceiros). A economicidade não pode ser separada da aferição de consequências no tempo e no espaço sob todos os seres. Nesta perspectiva, o consumo e a produção precisam ser reestruturados completamente, numa alteração do estilo de vida.[3]

A sustentabilidade social traz a exigência ética de atividades que considerem no decorrer do tempo e do espaço a coexistência humana de modo que não se exclua ou desiguale as diversas classes, raças, gêneros e gerações nas suas necessidades materiais e culturais. Envolve garantir condições de saúde e vida em comunidade, esta última conectada diretamente a noções de equidade, diversidade e democrática, assim como provendo uma melhor qualidade de vida, o cuidado e a proteção com os idosos; o direito à moradia e para isso a regularização fundiária, a proteção ao trabalho decente não sujeito a acidentes, toxidade ou contaminação física e psicológica.[4]

Freitas observa, contudo:

No limite pode-se afirmar que o princípio de sustentabilidade tem como pressuposto a ideia central de se construir uma modernidade ética, que impeça a destruição do processo de autoafirmação e de perenidade humana na Terra. Numa perspectiva em que se tenha no horizonte uma modernidade ética, e não apenas uma modernidade técnica. Uma ética que se edifique como crítica radical da noção de destino, entrelaçando inteligência e liberdade num vínculo virtuoso com o bem. Esta noção também não relativiza o conceito de acumulação originária, agente motor do processo de expansão e circulação do capital, instrumento necessário para alavancar, modular e perenizar os pilares dos processos de desenvolvimento, sustentado ou não. Também não explicita a necessária inclusão do contrato social, instrumento que imprime historicidade ao desenvolvimento.[5]

 

Verificada a abertura da noção de sustentabilidade e suas perspectivas é preciso agora ver a noção de aberta de desenvolvimento, seus elementos, sua autonomia conceitual e suas perspectivas para depois verificar a compatibilidade e limites entre desenvolvimento e sustentabilidade.

O desenvolvimento nos remete a alteração de um estado, um movimento progressivo de melhora para os seres humanos em diversos âmbitos. Por isso se indaga se o desenvolvimento seria um crescimento, ou uma expansão ou uma forma de progresso econômico ou realização de potencialidades ou alcance de um melhor estado geral. Todas essas definições são abrangidas pela noção de desenvolvimento, mas não se restringem a cada uma delas. Por isso, sem que se prenda o conceito a um enfoque exclusivamente econômico é preciso verificar se há necessidade de alteração desse estado, se haverá melhorias, se há amplitude geral, em que medida os benefícios são mais favoráveis que os riscos para avaliar concretamente se está diante de desenvolvimento.

Por exemplo, determinado desenvolvimento da agricultura, da indústria e da urbanização pode ao mesmo tempo gerar problemas de consumo de água. Por isso, a noção de desenvolvimento, além da expansão de atividades, exige o engajamento dos indivíduos a preservação do meio ambiente. Deve servir para a melhora do meio ambiente e não só para devastá-lo.[6] 

A noção de desenvolvimento passou por uma construção racional idealizada por instrumentos internacionais que não se confunde meramente com crescimento econômico, avaliação quantitativa do produto interno bruto ou do aumento da modernização produtiva ou capacidade industrial. Desenvolvimento é muito mais amplo porque envolve além da ótica econômica, também contextos sociais, trabalhistas, culturais, político, jurídico, ambientais, regionais, nacionais, de pluralidade, de tolerância, de liberdade e de igualdade, sendo que em cada um destes aspectos se desdobram também em múltiplos enfoques.[7]

Ao observar a trajetória histórica de abertura do conceito de desenvolvimento no direito internacional pode se verificar que a redação original da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 colocava separadamente “desenvolvimento e crescimento econômico”, redação essa que se manteve até 1960, o que a partir de então a redação do artigo 22 da Declaração estabeleceu seguiu no seguinte sentido:

Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.[8]

 

Em 1969, a Declaração sobre Progresso Social e Desenvolvimento da Assembleia Geral da ONU, já traz uma visão de desenvolvimento de compatibilidade com a noção de justiça social, diverso do paradigma liberal e do padrão eurocêntrico de exploração e colonização. Isso porque relacionou o desenvolvimento a dignidade humana e a justiça social, a eliminação de desigualdades, exploração dos povos, colonialismo e racismo, assim como efetivação de direitos civis e políticos e direitos políticos, sociais e culturais, conforme se pode ver abaixo:

O progresso e desenvolvimento social basear-se-ão no respeito pela dignidade e valor da pessoa humana e assegurarão a promoção dos direitos humanos e da justiça social, o que exige: a) A eliminação imediata e definitiva de todas as formas de desigualdade, exploração de povos e indivíduos, colonialismo e racismo, incluindo o nazismo e o apartheid, e de todas as outras políticas e ideologias que se oponham aos objetivos e princípios das Nações Unidas; b) O reconhecimento e a realização efetiva dos direitos civis e políticos, bem como dos direitos económicos, sociais e culturais, sem qualquer discriminação.”[9]

 

Tal declaração passou a se inter-relacionar com a Declaração das Nações Unidas sobre Direito ao Desenvolvimento de 1986, a qual previu também a abertura do direito ao desenvolvimento e sua categorização como direito humano inalienável, em que relacionou esse direito às perspectivas econômica, social, cultural e soberania sobre as riquezas e recursos naturais, conforme se pode verificar desde o seu artigo 1º:

§1. O direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável, em virtude do qual toda pessoa e todos os povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, para ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados.

§2. O direito humano ao desenvolvimento também implica a plena realização do direito dos povos à autodeterminação que inclui, sujeito às disposições relevantes de ambos os Pactos Internacionais sobre Direitos Humanos, o exercício de seu direito inalienável à soberania plena sobre todas as suas riquezas e recursos naturais.[10]

 

Importante se faz mencionar que neste momento de abertura do conceito de desenvolvimento no direito internacional e sua relação com a dignidade e justiça social, também vem se desenvolvendo na filosofia novo delineamentos de justiça social, fundada em perspectivas de redistribuição social e reconhecimento, a exemplo de Judith Butler e Nancy Fraser, uma vez que apontam a conjunta necessidade de inclusão social através de reconhecimento de direitos de distribuição de recursos e garantias sociais necessários para a vivência digna e de não integração através do reconhecimento de identidades e diversidade de pessoas, grupos e etnias que estabelecem princípios geral de proteção identitária e proibição da valoração negativa que informa o princípio de não discriminação.[11]

          Neste contexto, pode-se perceber a abertura e amplitude dos conceitos de sustentabilidade e desenvolvimento. O primeiro na análise de sustentabilidade do equilíbrio temporal (presente e futuro), espacial (centro e periferia, norte e sul) e vital (entre os diversos seres) e suas perspectivas ambiental, social e econômica. O segundo, no reconhecimento da amplitude do desenvolvimento para além da economicidade, produtividade, crescimento, e sua relação íntima com a não exploração e colonização, redução das desigualdades, o reconhecimento de identidades e diversidade de culturas e formas de viver, assim como garantia de satisfação de necessidades humanas e acesso a riqueza e recursos da natureza.

Nessa linha, Leonardo Boff aponta:

A concepção de sustentabilidade não pode ser reducionista e aplicar-se apenas ao crescimento/desenvolvimento, como é predominante nos tempos atuais. Ela deve cobrir todos os territórios da realidade que vão das pessoas, tomadas individualmente, às comunidades, à cultura, à política, à indústria, às cidades e principalmente ao planeta terra com seus ecossistemas. Sustentabilidade é um modo de ser e de viver que exige alinhar as práticas humanas às potencialidades limitadas de cada bioma e às necessidades das presentes e das futuras gerações.[12]

 

É sob esse prisma de abertura e diversidade de paradigmas que se deve verificar a compatibilidade entre desenvolvimento e sustentabilidade sob a perspectiva ambiental, se o antropocentrismo traz limites de compatibilidade, se há alternativas mais viáveis ao equilíbrio ecológico, se há possibilidades de cedência da proteção ambiental aos interesses econômicos dentro dos marcos normativos existentes e formas de regulação das atividades poluidoras.

Para isso, segue um simplificado esboço da trajetória de proteção ambiental no âmbito internacional de consagração do desenvolvimento sustentável como princípio de proteção ambiental, sua relação e adoção pela legislação brasileira e algumas contribuições dos pensadores e literatura no campo ambiental.

Em uma etapa prévia a adoção da fórmula de desenvolvimento sustentável o direito internacional previu proteção ambiental em 1925 através do Protocolo de Genebra ao estabelecer disciplina e proibições do uso de gases tóxicos e armas bacteriológicas, em 1940 por meio da Convenção de Proteção da Fauna e Flora e Belezas Cênicas das Américas, em 1958 Convenção Internacional para Prevenção de Poluição sobre o mar por óleo, em 1959 Tratado da Antártida que estabelecia o uso pacífico e para pesquisas da Antártida.[13]

A partir deste momento surgiram as primeiras expressões do grupo de Roma sobre a degradação ambiental devido a superpopulação e crescimento que se seguiram durante toda a década de 60 sobre crises econômicas, petróleo, limitação de recursos naturais, falta de políticas públicas e gestão de recursos hídricos, regimes econômicos de países industrializados e em desenvolvimento, crescimento populacional, assentamentos humanos, novas tecnologias, escassez de alimentos e posteriores discussões sobre a ordem econômica mundial.[14]

Na década de 60 também se incorporava no âmbito formal do direito internacional o Acordo sobre o uso de Armas Nucleares em 1963 com proteção contra a poluição nuclear no espaço e nos oceanos. Também foi realizada a Conferência da Biosfera da UNESCO de 1969 que definiu o conceito de biosfera e formas de sua conservação.

Na década de 70, a Conferência das Nações Unidas sobre o meio Ambiente de 1972, chamada de Conferência de Estocolmo, passou a delinear as relações entre homem e meio ambiente, embora sob um viés de utilidade e perspectiva antropocêntrica. A Conferência tem centralidade no homem e na vida humana, sua capacidade de transformação e dependência do meio ambiente para o bem-estar, o gozo dos direitos humanos e o direito à vida mesma. Apontou a necessidade de defesa e melhoramento do meio ambiente para as gerações presentes e futuras como meta da humanidade. A Conferência não referiu expressamente desenvolvimento sustentável, mas trouxe um paradigma geral de ecodesenvolvimento econômico e social que propôs estratégias de desenvolvimento aliadas modos de preservação do meio ambiente desdobrado em uma série de princípios no sentido de evitar esgotamento de recursos não renováveis, planejamento adequado com ordenamento mais racional para preservação do ar, do solo, da flora e dos ecossistemas naturais. Também tratou sobre atividades industriais e seus efeitos sobre o meio ambiente, crescimento populacional, planejamento de assentamentos humanos e urbanização, estabelecimento de políticas sociais e ambientais, transferências de recursos e tecnologia para países em desenvolvimento. 

A posição do Brasil, assim como da Índia foi contrária a Conferência de Estocolmo. Mas apesar disso a Convenção teve influência na legislação brasileira sobre meio ambiente, sobretudo nos enfoques gerais e paradigmas de ecodesenvolvimento a partir da década de 80 na criação da Secretária Especial do Meio Ambiente, a instituição pela Lei 6.938/91 do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA e da Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA.[15] Também influenciou a Resolução n.1 Conama e o art. 225 da Constituição Federal de 1988, momento em que também foi a fundado o Ibama.

No âmbito internacional, ainda em 1982 adveio a Convenção sobre os direitos do mar com previsão de preservação, utilização equitativa, eficiência de recursos, definição de espaços jurídicos marítimos como a plataforma continental, mar territorial, zona contigua, águas interiores e zona econômica exclusiva.

Contudo, somente em 1987, através do chamado Relatório Brundtland, intitulado de Nosso Futuro Comum, que há a primeira referência no âmbito internacional da fórmula do Desenvolvimento Sustentável, paradigma antropocentrista, que relaciona progresso econômico ao atendimento do equilíbrio do meio ambiente, relaciona exigência de reformas econômicas, redução da pobreza, crescimento econômico, redistribuição e atendimento das necessidades humanas essenciais da população, manutenção de um nível populacional sustentável, conservação da base de recursos e reorientação da tecnologia e administração do risco, enfim incluindo o meio ambiente e a economia no processo de decisão. Dispõe o relatório:

O desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades. Ele contém dois conceitos-chave: o conceito de necessidades, sobretudo as necessidades essenciais dos pobres do mundo, que devem receber a máxima prioridade; a noção de limitações que o estágio de tecnologia e da organização social impõe ao meio ambiente, impedindo-o de atender às necessidades presentes e futuras.[16]  

 

Em 1992, se aprofunda, se estabiliza e se passa a adotar de forma central o conceito de desenvolvimento sustentável na RIO 92, também chamada de Cúpula da Terra, um evento múltiplo que envolve princípios relacionados ao desenvolvimento sustentável, regramentos sobre biodiversidade, biotecnologia e mudanças climáticas, expressões sobre proteção das florestas, agendas globais, regionais e locais sobre o meio ambiente, estratégias econômicas, redução da pobreza e crises ecológicas. A ECO92 foi composta pela: a) Carta Terra; b) Convenção da Biodiversidade; c) Agenda 21; d) Carta das Florestas; e) Convenção quadro da ONU sobre mudanças do clima.

A Carta da Terra expressa uma declaração de 27 princípios também fortemente marcada pelo antropocentrismo, que em termos de desenvolvimento sustentável coloca o ser humano na centralidade deste conceito, sendo o meio ambiente parte integrante do desenvolvimento.

A declaração propôs a necessidade de eliminação da pobreza e reduzir as disparidades no padrões de vida; atender as necessidades dos povos; reduzir modos de produção e consumo não viáveis e promover políticas demográficas adequadas; aperfeiçoar conhecimentos e técnicas em torno do desenvolvimento sustentável, acesso à informação e participação dos cidadão nas decisões; acesso a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive referente a compensação e reparação de danos; adotar legislações ambientais eficazes de acordo com contexto de desenvolvimento de cada país, bem como referente a responsabilidade de indenização às vítimas de poluição; manter sistema econômico aberto para criar crescimento econômico e desenvolvimento sustentável; assevera a importância das mulheres na gestão do meio ambiente e relevância dos jovens para promoção do desenvolvimento sustentável; reconhece que as populações indígenas tem papel fundamental na gestão do meio ambiente e os Estados devem reconhecer a identidade, cultura e interesses dessas populações e habilita-las a participar do desenvolvimento sustentável; refere ainda que paz, desenvolvimento e proteção ambiental são interdependentes e indivisíveis.[17]

Apesar de uma série de alternativas interessantes da Carta da Terra, há fragilidades nos apontamentos de formas operacionais de alcance das metas propostas. Como forma de atender essa questão a RIO92 promoveu a chamada Agenda 21 como forma de planejamento ambiental e formulações de políticas públicas para alcançar o desenvolvimento sustentável tanto sob o enfoque global como sob ações locais. Nessa linha procura identificar os problemas prioritários, os recursos existentes e os meios de enfrentá-los. O documento com 40 capítulos foi dividido em quatro seções: a) dimensões econômicas e sociais; b) conservação e administração de recursos; c) fortalecimento dos grupos sociais e organizações dedicados a sustentabilidade; e d) meios de implementação.[18]

De outro lado, a Convenção da Diversidade Biológica (CDB) resultante da Conferência da Rio92 (CNUMAD) se tornou vinculante e de cumprimento obrigatório para os 168 estados signatários até o momento, sendo o documento mais relevante relacionado a biodiversidade marinha, costeira, florestal, das terras áridas e subúmidas, áreas de montanhas e agrícolas. A CDB estabeleceu uma série de conceitos sobre biodiversidade, biotecnologia, modos de divisão justa dos benefícios pela utilização de recursos genéticos, modos equilibrados de utilização e refere logo sua articulação com o desenvolvimento sustentável no Princípio 2º ao estabelecer que a utilização sustentável significa a utilização de componentes da diversidade biológica que não levem, no longo prazo, à diminuição da diversidade biológica, mantendo seu potencial para atender as necessidades das gerações presentes e futuras.

Também cabe referir que logo no início do preâmbulo da CDB há referência sobre o valor intrínseco da diversidade biológica e dos valores ecológico, genético, social, econômico, científico, educacional, cultural, recreativo e estético da diversidade biológica e de seus componentes cuja característica difere de uma posição acentuada de antropocentrismo.   Ademais, Frederico Amado comenta:

A CDB tem definido importantes marcos legais e políticos mundiais que orientam a gestão da biodiversidade em todo o mundo: O protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, que estabelece as regras para a movimentação transfronteiriça de organismos geneticamente modificados (OGMS) vivos; o Tratado Internacional sobre Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura, que estabelece, no âmbito da FAO, as regras para acesso aos recursos genéticos vegetais e para a repartição de benefícios; as diretrizes de Bonn, que orientam o estabelecimento das legislações nacionais para regular o acesso aos recursos genéticos e a repartição dos benefícios resultantes da utilização desses recursos (combate à biopirataria); as Diretrizes para o Desenvolvimento do Turismo Sustentável e a Biodiversidade; os Princípios da Addis Abeba para a utilização sustentável da Biodiversidade; as Diretrizes para a Prevenção, Controle e Erradicação das Espécies Exóticas Invasoras, e os Princípios e Diretrizes da Abordagem Ecossistêmica para a Gestão da Biodiversidade. Igualmente no âmbito da CDB foi iniciada a negociação de um Regime Internacional sobre Acesso aos Recursos Genéticos e Repartição dos Benefícios resultantes desse acesso.[19]

 

A Rio92 (CNUMAD) ainda resultou na Declaração de Princípios de Desenvolvimento Sustentável sobre as Florestas (carta das florestas) visando impedir o desmatamento continuo sobre as florestas de todos os tipos, referindo a necessidade de consenso global, cooperação entre Estados, tecnológica e financeira e observando no Princípio 2º que “os recursos florestais e áreas florestais devem ser geridas de forma sustentável para atender às necessidades sociais, econômicas, ecológicas, culturais e espirituais das gerações presentes e futuras.[20]

E por fim, foi produzida a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre o Clima de 1992 que tratou sobre medidas e estratégias a nível global, regional e nacional sobre a mudança do clima e estabilização do efeito estufa. Referiu o princípio da precaução para evitar ou minimizar mudanças do clima, diante de ameaças de danos, a falta de certeza científica não deve ser usada como razão para postergar essas medidas de enfrentamento a mudanças do clima (art. 3.3). Ainda observou o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas das nações e suas capacidades de modo que os países mais emissores poluentes devem tomar uma série mais eficazes de medidas de mitigação das mudanças climáticas. (artigos 3 e 4).[21]

Neste contexto, toda a multiplicidade de conferências, reuniões, declarações e convenções que estiveram no âmbito da Conferência das Nações Unidas sobre meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio92 tenham trazido uma base de princípio e suporte amplo de proposições e formulações para atender o desenvolvimento sustentável a sua falta de efetividade ao longo do tempo e o continuo processo de degradação ambiental em grande parte do planeta traz uma série de reflexões se o a fórmula de desenvolvimento sustentável tem limitações para garantir proteção justa e efetiva do meio ambiente. 

Entre outras questões e apesar de todo esforço para mudança do cenário ambiental, é destacável o caráter predominantemente antropocentrista e privilegiado do progresso econômico no enfoque de desenvolvimento sustentável. Houve poucas críticas ao sistema mundo de produção ou forma de produção globalizada de suporte alimentar, de matéria prima e de todo o fluxo do Sul Global para o Norte Global caracterizados pela monocultura, mineração e extração de riquezas naturais essenciais na forma do capitalismo internacional, que inclusive naquele momento de fim de guerra fria e colapso da experiência soviética, o sistema mundo de mercado implementava as medidas mais forte de introdução ao neoliberalismo cujos resultados já estão bem conhecidos nesta segunda década do século XXI.

Mas as proposições, metas, detecções de limites e problemas das formas de proteção ambiental exigiram mais esforços e manutenção de reedições contínuas da Conferência do Meio Ambiente e Desenvolvimento, como foram a RIO+5, RIO+10 e RIO+20. Em cada uma dessas aumentou o enfoque do desenvolvimento econômico e participação do âmbito privado. 

A Rio+5 se realizou em 1997 e teve o objetivo de concretizar as promessas da RIO92, verificar as metas e o seu não cumprimento, fazer um balanço sobre a Rio92 e considerações críticas, observar o avanço do desmatamento e a insuficiência das medidas de combate ao efeito estufa, e trazer o ambiente favorável para as negociações sobre a redução de emissões dos gases que adveio no mesmo ano através do Protocolo de Kyoto em dezembro de 1997.    

Na Rio +10, Cúpula Mundial de Desenvolvimento Sustentável de 2002 foi proferida a declaração de Joanesburgo sobre o uso sustentável dos recursos naturais, equidade e da erradicação da pobreza, globalização, questões energéticas, Mecanismo de Desenvolvimento Limpo –MDL e os efeitos das mudanças climáticas, reforçando os compromissos assumidos anteriormente.[22] 

Porém, na RIO+10, o setor privado em articulação com a institucionalidade pública já trazia um privilegiado espaço de deslocamento das normas de proteção ambiental para oportunidades no âmbito privado e negocial que tivessem relação com o meio ambiente, sustentabilidade e desenvolvimento econômico. Roberto Guimarães e Yuna Fontoura comentam que inclusive a RIO+10 se apresentaram possibilidades de retrocessos e basicamente ameaças a três questões: a) esvaziamento do Princípio da Precaução (com a tomada do enfoque ecossistêmico); b) revogação do princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas; c) retroceder nos compromissos de recursos novos e adicionais assumidos pelos países desenvolvidos.[23]

          Em 2012, na Rio+20, a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável apontou diretrizes para uma economia verde e erradicação da pobreza, promoção de padrões de consumo e produção sustentáveis, crescimento econômico sustentável, fortalecimento da cooperação internacional entre outros. O documento também tratou sobre mercado e setor privado, comércio internacional, saúde humana, segurança alimentar, mudança climática, biodiversidade e florestas, bem como deu relevância a necessidade da boa governança, objetivos econômicos e ambientais.

          Em face da análise dos discursos da Rio+ 20 Guimarães e Fontoura tecem algumas análises que se faz pertinente trazer para entender os objetivos reais e quais prevalecem no discurso. Assim destaca-se a importância do setor privado para o desenvolvimento sustentável no seguinte sentido:

Discurso de mercado que emerge a partir da união dos demais como ator fundamental para o desenvolvimento sustentável, não apenas no documento oficial final da Rio+20, mas também mediante eventos paralelos à cúpula, como: Fórum de Sustentabilidade Corporativa, Fórum de Sustentabilidade Empresarial da Rio+20, Conferência Internacional do Instituto Ethos, Eventos Especiais sobre Cidades Sustentáveis, Seminário Sebrae +20. De fato, foi possível identificar no documento final a menção ao setor privado mais de vinte vezes ao longo do texto, como agentes que devem se engajar para que o desenvolvimento sustentável seja alcançado em “todos” os seus principais temas (exemplo, saúde humana, segurança alimentar, mudança climática, biodiversidade, florestas). Some-se a isto o destaque ao comércio reforçado no documento oficial (UNCSD, 2012b, p.49) “Reafirmamos que o comércio internacional é um motor de desenvolvimento e crescimento econômico sustentado, e também reafirmar o papel crítico que um sistema comercial multilateral universal, baseado em regras, aberto, não discriminatório e equitativo, bem como um comércio significativo liberalizado, pode estimular o crescimento econômico e o desenvolvimento em todo o mundo, beneficiando assim todos os países em todos os estágios de desenvolvimento, à medida que avançam em direção desenvolvimento sustentável.”[24]

 

Ressalta-se, a ratificação pela ONU e governantes dos valores neoliberais. Sedimentado no neoliberalismo e no discurso da economia verde as grandes corporações privadas de países desenvolvidos se favorecem, pois se beneficiarão do modelo de “financiamento” da natureza, colocando seus interesses e de seus negócios com o rótulo “verde”, sem ao menos se questionar suas obrigações concretas de alteração nos padrões de produção, gerenciamento, contribuições sociais, distribuição e na gestão.[25] 

No que tange aos combustíveis fósseis, no documento final não ocorreu nenhum ajuste sobre eliminar os subsídios a esses combustíveis, bem como não houve acordo entre governos na alteração do atual modelo energético, restando novamente atendidos e favorecidos os interesses das empresas de Petróleo (produção, refinamento e distribuição) e às grandes montadoras de automóveis.[26]

No campo da biossegurança, tema presente também debatido na Rio-92, a situação restou inalterada, já que no texto “O Futuro que Queremos”, a referência aos Organismos Geneticamente Modificados (OGM) no campo não passou por nenhuma crítica ou ressalva para questionar os possíveis riscos ao meio ambiente, saúde; impactos sociais do advento da biotecnologia na produção agrícola. O texto reconhece a necessidade de uma agricultura mais inclusiva e que valorize as pequenas comunidades agrícolas. Nessa linha, mais uma vez o que prevaleceu o discurso a favor do setor privado na Rio+20, prevalecendo os interesses das empresas produtoras de semente (Monsanto, Bayer Cropscience, Syngenta e Dupont) sem qualquer empecilho para seus negócios.[27]

Encerrada as atividades da Rio+20 a conclusão é que mais uma vez os valores neoliberais prevaleceram, mesmo sendo o principal protagonista das crises econômicas, sociais e ambientais que aflige o mundo. Com isto, a conclusão que se pode tirar é que os interesses dos países desenvolvidos na agenda ambiental global juntamente com o setor privado estabelecem-se como núcleo e protagonistas “de poder no processo de governança para o desenvolvimento sustentável, o que, por sua vez, é perigoso pela perpetuação dos mesmos valores “insustentáveis” do passado.” Contudo, um ponto positivo da cúpula a ser ressaltado, foi estabelecido os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), propostos pela Colômbia e Guatemala, com foco de espraiar os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM), no entanto sem muitas definições e debates. [28]

          Neste contexto, se verificou que o conceito de desenvolvimento sustentável teve toda uma trajetória de ampliação e sua fórmula em si trouxe a possibilidade de substituição da modernidade técnica pela modernidade ética, racionalização das escolhas em dimensões de tempo e espaço, prevendo consequências para as gerações presentes e futuras, a afetação dos diversos espaços, assim como apresentar abertura conceitual por abranger por um lado, a sustentabilidade social, ambiental e econômica nos processos de decisão pública e privada, e de outro, trazer dimensões de desenvolvimento que não se restringe ao exclusivo enfoque do crescimento econômico, mas abranger também o equilíbrio ecológico, a biodiversidade, a sociodiversidade, a preservação dos ecossistemas, a redução das desigualdades econômicas e sociais, a eliminação da pobreza, a valorização positiva das diferentes culturas e reconhecimento e garantia de direitos humanos.

No entanto, apesar desta múltipla possibilidade do desenvolvimento sustentável e da trajetória do conceito e dos marcos nacionais e internacionais se mostra perceptível os desajustes, limites e dificuldades na sua relação com as estruturas econômicas e sociais do sistema mundo de produção e consumo, colonialidade e exploração dos países centrais em relação aos países periféricos do capitalismo, dificuldades por conta da cosmovisão antropocêntrica sobre as formas de agir, pensar e valorar sobre o meio ambiente, o que diante do aprofundamento do neoliberalismo deu cenário e patamar privilegiado ao mercado estabelecer agendas políticas e econômicas concretas diferentes das necessidades humanas presentes e futuras, diversas das condições necessárias de preservação das espécies, da fauna e da flora, cujo conjunto não só prevalecem sobre as normas de preservação ambiental, como também permitem a transformação do conceito de desenvolvimento sustentável, até esvaziar seus elementos e deslocar seu enfoque para um paradigma de oportunidades negociais sob uma racionalidade instrumental de tirar proveito econômico da publicidade verde e natural sem realmente contestar os principais eixos de poder de destruição ambiental e social.

Freitas observa ainda: a) a dificuldade simbólica de rompimento com a forma clássica de desenvolvimento; b) diferenças e incompatibilidades entre sustentabilidade e crescimento, que resulta no privilegiamento do mercado de bens; c) acumulação originária e exploração: países centrais se sustentam em detrimento da pauperização dos países periféricos do capitalismo; d) hipocrisia dos países centrais no atendimento prático das medidas de desenvolvimento sustentável para evitar descontentamentos eleitorais; e) desenvolvimento sustentável só tem vigência histórica em experiências locais de aproveitamento dos recursos de um território, envolvendo configurações sociais e políticas de aplicações de tecnologias disponíveis. A universalização dessas experiências locais exige a preservação da biodiversidade de forma estreitamente associada à diversidade cultural.[29]

Diante disso, é preciso discutir toda a estrutura política, econômica, social e institucional que dá suporte desde a fundação da modernidade ao modo de produção capitalista agrícola e industrial e mercado de consumo de massa, principalmente voltada aos países centrais, como se organiza e se desenvolve o paradigma uniformizador de seres humanos e seres não humanos (da natureza, animais/vegetais) e sua afetação a sociodiversidade e biodiversidade e observar como o modelo de produção sob um paradigma de exploração intensificam o desequilíbrio ecológico e apesar de mudanças setoriais, não inibem a continuidade prática da exploração intensiva dos recursos naturais.

 

3.   ALTERNATIVAS DECOLONIAIS QUE VISEM A SUSTENTABILIDADE 

 

Ao se falar em natureza é preciso resgatar o ideal da modernidade ocidental através da dupla fratura, como bem explica Ferdinand na qual temos a fratura colonial e a ambiental que aparta a história colonial e a história ambiental no mundo. Nesse sentido, por meio do pensamento cartesiano de dualidade que separa natureza e cultura, meio ambiente e sociedade, corpo e mente, sujeito e objeto se promoveu hierarquias de valores que colocam o homem acima de tudo, inclusive acima da natureza.

            A fratura colonial constitui o outro, realiza a separação entre seres humanos e os espaços geográficos, isto é, produz clivagens sociais que segrega em categorias como: europeus e não europeus; brancos e não brancos, senhores e escravos; metrópole e colônias entre países do norte e países do sul.[30]

            Diante disso, ao se falar em dupla fratura a figura do colonizador no topo da hierarquia dos valores, na história e nos desejos, que controla a vida dos colonizados, bem como promove a fratura através da homogeneidade dos colonizadores, na qual reduz à experiência ao do homem branco, mas ao mesmo tempo reduz a experiência dos colonizados à um homem racializado.[31]

          A modernidade através de uma visão de superioridade, de imposição do modelo hegemônico a ser seguidos por todos os demais não europeus, se pauta exclusivamente no antropocentrismo, pelo qual o homem passa a ser o único ser superior, dotado de consciência, valores e moral sobre os demais seres e elementos que formam a terra. Nessa linha, a dicotomia entre humanidade e a natureza pressupõe que a natureza possui a sua sobrevivência em razão do progresso da humanidade.[32]

A categoria antropocêntrica refere-se às posturas voltadas para o ser humano, colocando-o como ponto de partida para qualquer avaliação. O ser humano ocupa um lugar privilegiado, concebendo que as pessoas são substancialmente diferentes dos demais seres vivos, únicas por suas capacidades cognitivas, porque são autoconscientes e, portanto, só elas podem atribuir valores. Desta forma, apenas os humanos podem ser sujeitos de valor, de onde os demais elementos que nos cercam, como plantas ou animais, são objetos de valor. O antropocentrismo também implica um sentido de interpretar e sentir o ambiente com base nas necessidades e desejos dos próprios humanos. Portanto, de acordo com essas posições, direitos e obrigações só podem residir nas pessoas. A natureza como categoria plural é desarticulada, e é concebida como um conjunto de elementos, vivos ou não vivos, onde alguns podem ter utilidade atual ou futura. Espécies e ecossistemas são objetos e podem pertencer a humanos. Como se vê, o antropocentrismo impõe uma valoração que é extrínseca, no sentido de que os valores são propriedades externas dos objetos, e só podem ser outorgados pelos humanos. Uma planta, um animal ou uma cachoeira não possuem valores próprios ou próprios, mas são atributos que lhes são dados pelas pessoas.[33]

 

          O antropocentrismo é essencialmente utilitarista que permeia seu agir na obtenção do lucro de maneira a fragmentar a natureza, classificando-a como «recursos». “Por outro lado, a apropriação desses «recursos» requer necessariamente poder controlar, manipular e possuir o meio ambiente. Eles defendem as posições que permitem extraí-los, separá-los, transferi-los, modificá-los.”[34] Cajigas-Rotundo, ainda destaca que:

[…] a natureza está escrita em linguagem matemática válida para todos os lugares e tempos, é universal e necessária, perdendo assim qualquer atributo e valor que possa ter em si para além dos interesses humanos; não há mais telos —fim último— na natureza, mas apenas na ação humana.[35] 

 

          Diante desse contexto, os utilitarismos enraizados no antropocentrismo, não aceitam a natureza como sujeito de direitos; nem há direitos da Natureza, sendo uma ideia inaceitável.[36] Essa visão antropocêntrica de resistência em não reconhecer o valor intrínseco das plantas, animais e ecossistemas, leva em consideração que apenas os seres humanos podem atribuir valores, não fazendo sentido a ideia de valor próprio, isto é, onde não existem humanos, não existiriam valores.[37] Além disso, acresce Vandana Shiva que:

As patentes sobre a vida e a retórica da sociedade da propriedade- em que tudo- água, biodiversidade, células, genes, animais, plantas- é suscetível de se converter-se em uma possessão, que expressam uma visão de mundo em que as formas de vida carecem de valor intrínseco, de integridade e reconhecimento como sujeitos. [38]

 

Frente a negação da natureza como sujeito de direitos, com valor intrínseco que possui um fim em si mesmo é possível visualizar a intersecção da colonialidade do poder, do ser, do saber e da biocolonialidade do poder, essa última com operatividade sobre a natureza.  Diante da colonialidade “cada “pensamento” incompatível com a normatividade filosófica ocidental sofreu uma das múltiplas formas de negação, exclusão ou incorporação.”[39]

            Diante desse cenário, a contribuição para uma vida sustentável na terra vem por meio da decolonidade, de maneira a repensar o vínculo dos seres humanos com a natureza. Assim, o primeiro passo a ser dado é a ruptura do utilitarismo antropocêntrico estabelecido pela modernidade, outro passo é atribuir valor intrínseco a natureza, de modo a pautar-se no biocentrismo, onde os seres humanos são partes integrantes do todo e não os donos de tudo. 

Quando se postula que existem valores próprios na Natureza, não se nega que os humanos atribuam valores, mas sim aceita-se que outros seres vivos tenham valores inerentes e independentes de utilidade para as pessoas. Reconhece-se e defende-se que as espécies podem desenvolver os seus projetos de vida e que os ecossistemas persistem, e que tudo isto é um direito em si. É importante notar que este passo em direção aos direitos da Natureza não nega ou altera os conteúdos referentes aos direitos dos cidadãos a um meio ambiente saudável, usualmente conhecidos como direitos humanos de terceira geração. Estas últimas são as que prevalecem na regulamentação de quase todos os países latino-americanos. As duas abordagens dos direitos ambientais são válidas, e é bom que tenham sido mantidas e articuladas entre si. Só é preciso ter em mente que esses direitos clássicos a um meio ambiente saudável estão voltados para as pessoas: são direitos humanos, e a Natureza é cuidada desde que isso afete as pessoas e não por seus próprios valores.[40]

 

Nessa linha, a busca pela visão biocêntrica pauta-se em uma ecologia profunda, isto é, uma ecofilosofia que através de diferentes caminhos filosóficos e políticos pode ser alcançado, tanto como, forma de reagir em face a modernidade, bem como, através das lentes dos povos originários. Ainda, “explora formas extensas e substantivas de identificação com o ambiente, nas quais a pessoa necessariamente se concebe dentro de um ambiente natural. Gerando uma «comunidade» de vida com abrangência ecossistêmica.”[41] Também, “propõe redesenhar de maneira integral todos os nossos sistemas a partir de valores e métodos que realmente conservem a diversidade ecológica e cultural dos sistemas naturais”[42]

Dessa maneira, não faz sentido a separação entre seres vivos e natureza, pois “somos todos parte da natureza, e a Pacha, como todo, tem vida. Logo, o reconhecimento e o pertencimento ao conjunto são chaves para o bem viver, justificando o princípio da “totalidade” como núcleo da cosmovisão andina.”[43]

Além disso, Josef Estermann acresce que a filosofia andina através de uma ecosofia desconsidera o ego cogito ocidental, rechaçando uma sociedade pautada no indivíduo autônomo e competitivo, pois é vista como ameaça pelos povos andinos. Os pressupostos da Modernidade Ocidental -independência, individualismo, confronto entre a humanidade e Natureza, dissociação do profano do religioso, etc., é que agravam a crise global.[44]

A filosofia andina como alternativa a ruptura do modelo antropocêntrico cartesiano europeu é decorrência do princípio da relacionalidade, que se encontra presente em “todas as entidades, estratos e princípios”, tendo em vista, a sua transcendentalidade, bem como revela-se, “a nível cósmico, antropológico, econômico, político e religioso nos e pelos princípios da correspondência, complementaridade, reciprocidade e ciclicidade.”[45]

Sendo a Pacha um organismo vivo, o princípio da relacionalidade nos ensina que tudo se encontra conectado, isto é, uma mudança em uma parte acarreta uma consequente mudança na outra parte. Assim, na ecosofia andina o princípio da relacionalidade tem um longo alcance, no seguinte sentido:

Primeiro, toda transação econômica carrega efeitos ecológicos, sejam eles positivos ou negativos. Em segundo lugar, a qualidade “vital” das relações ecosóficas é expressa em termos de equilíbrio e harmonia (taypi). E em terceiro lugar, qualquer deterioração desse equilíbrio em uma parte do “organismo” ecosófico acarreta deterioração nas outras partes.[46]

 

Cabe destacar que o crescimento desordenado, de forma ilimitada não faz sentido, pois os organismos são finitos e limitado, esse crescimento gera desequilíbrio, pois quando se destrói uma parte a outra parte também sofre afetação. Assim a solução a ser adotada é o regate do equilíbrio, a unidade do todo, de maneira a sanar as desigualdades sociais, econômica, culturais, a injustiça, a marginalização, a destruição, etc. de levam a crise em todo o “organismo” ecosófico.[47]

          O princípio da correspondência dentro “da ecosofia significa que o macrocosmo se reflete no microcosmo e vice-versa, ou seja, que a ordem cósmica da pachasofia encontra seu reflexo (“correspondência”) na ordem ecosófica do estrato experiencial do ser humano.”[48]

Ecosofia é o cuidado e conservação do equilíbrio cósmico e espiritual ao nível da gestão dos recursos, da utilização dos meios de produção (terra, minerais, ar, água, trabalho) e costumes de consumo. A «justiça cósmica», ou seja, o equilíbrio cósmico da pacha, deve se refletir no nível antropológico, social e econômico, como ciclos auto-reguladores de produção e consumo, onde o input é igual ao output, ou seja: onde a soma das energias produzidas e reproduzidas chega a zero, equilíbrio perfeito. Uma economia de exploração excessiva dos recursos naturais (não renováveis) não corresponde à lógica da justiça cósmica e prejudica gravemente o equilíbrio da vida. Uma das formas favoritas de restaurar esse equilíbrio deteriorado em nível cósmico é para os andinos o ritual. Como não há relação causal “mecânica” entre o macro e o microcosmo, a efetividade do ritual também não passa por essa lógica mecanicista, mas sim pela racionalidade da “eficiência simbólica”. O ritual é um ato eminentemente ecosófico, tanto econômico (consumo e restituição) quanto ecológico (cuidado e retribuição simbólica)[49]

 

            Ainda “o princípio de complementaridade que rege o mundo andino para todas as esferas da vida, política, social e econômica, assim como religiosa, espiritual e cósmica, também é vital para as relações ecosóficas.”[50] A reciprocidade é outro princípio que faz parte da ecosofia e “expressa justiça equilibrada nas interações e transações de conhecimento, conhecimento, bens, serviços, dinheiro e deveres.”[51] Englobando as áreas dos rituais, simbologias e o cosmo na sua totalidade.

          O princípio da ciclicidade se pauta em ciclos dirigidos “pelos ritmos astronômico, meteorológico, agrícola e vital”. No qual, “questiona a ideologia do desenvolvimento como um avanço praticamente automático, desde o início até um suposto fim, bem como a definição quantitativa de «progresso» (PIB, taxa de crescimento, etc.)”[52] de maneira a superar o pensamento moderno de total desconsideração.

Tanto a produtividade quanto o consumo seguem os ciclos estacionários e os métodos “ecológicos” de conservação de alimentos (charki ou carne seca; ch’uñu ou batata congelada; pisos ecológicos para lavouras; etc). A Concepção de Capitalismo e Hedonismo Contemporâneos pós-modernismo que tudo deve e pode ser produzido e consumido durante todo o ano, independentemente da temporada, exerce uma pressão incrível sobre os sistemas ecológicos e constitui para a racionalidade andina um absurdo e uma ameaça de suicídio coletivo.[53]

 

            Em face da ecosofia andiana busca-se o bem viver[54] como forma de manutenção da vida, de maneira equilibrada, e de respeito a natureza. Além disso, “o «bem viver» andino atinge dimensões cósmicas, ecológicas (no sentido de uma ecologia espiritual ou mesmo metafísico), religioso-espiritual, social, econômico e político.”[55]

Josef Estermann propõe algumas alternativas[56] de se reabitar a terra a partir da ecosofia andina e do viver bem que demonstram que os povos andinos possuem uma visão ampla e de coexistência com todos os elementos que habitam a terra. Frente a essas alternativas de ecosofia andina e de viver bem se mostra possível um novo caminho, uma nova diretriz a ser seguida para o resgate e manutenção da vida. Nesse sentido, é preciso compreender que a filosofia andina é um conhecimento ancestral que foi renegado, apagado e silenciado em prol de um episteme colonial, moderna, branca, capitalista e eurocentrada que se pauta no individualismo em desfavor do coletivo. Assim, a busca é por um outro paradigma, que nessa proposta é através da decolonização da natureza, que exige profundas transformações e tendo como guia a ecosofia andina e o viver bem dos povos andinos. Em suma, é possível uma convivência sustentável entre humanos e natureza, buscando-se a reestruturação dessa relação, assim como a busca por uma ecologia equilibrada só pode brotar de uma conduta antirracista e decolonial.

 

4.   CONCLUSÃO

 

          Tendo em vista o contexto observado, os vários encontros de fóruns que buscam uma agenda ambiental global sustentável que visem o bem-estar das presente e futuras gerações, e alternativas a crise vivida na atualidade é possível concluir que apesar dos esforços para estabelecer metas viáveis e compromissos com a sustentabilidade, ainda padece frente aos interesses privados de grandes corporações e da cartilha neoliberal que continua a ditar as regras. As discussões em alguns pontos podem até ter evolução na forma de estabelecer a relação do humano e a natureza, mas ao mesmo tempo que avança também retrocede, ficando a desejar, tornando-se meras promessas e procrastinada para o futuro.  

Em virtude de toda a multiplicidade de conferências, reuniões, declarações e convenções demonstrou que a falta de efetividade ao longo do tempo e o aceleramento do processo de degradação ambiental continua a avançar no planeta, deixando o enfoque do desenvolvimento econômico e participação do âmbito privado em desfavor do coletivo sem uma real proteção justa e efetiva do meio ambiente.  Ainda, o caráter predominantemente antropocentrista e privilegiado do progresso econômico continua a permear o desenvolvimento sustentável, o que normalmente afasta as possibilidades de consideração da biodiversidade, socio-diversidade e autossustentabilidade.

            Por isso tudo, a proposta da decolonialidade busca a ruptura do utilitarismo antropocêntrico estabelecido pela modernidade, bem como a atribuição de valor intrínseco a natureza, de modo a pautar-se no biocentrismo e ainda trazer a filosofia andina e o viver bem como alternativa decolonial que visa o equilíbrio, reconhecimento e simbiose na natureza com o homem.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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 Citas



[1] Mestre en Cultura Jurídica: Seguridad, Justicia y Derecho. – Universitat de Girona (2018), Universitá degli Studi di Genova (2020) e Universidad Austral de Chile- – 2018 (tripla titulação). Especialista em Direito Público pela Esmafe/IMED/RS. Graduado em Direito pela Universidade Comunitária de Chapecó/SC. Ex-defensor público federal. Observador externo convidado das eleições presidenciais de 2018 da Colômbia. Atualmente é juiz federal substituto – Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Vencedor do Concurso Nacional de Decisões e Acórdãos em Direitos Humanos promovido pelo CNJ pela categoria Direitos dos Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais. Mestrando em direito pela Universidade Católica de Brasília. Lattes ID: https://lattes.cnpq.br/7066127804004265.

[2]Machado faz essa análise dos três elementos da sustentabilidade, porém sem a perspectiva espacial. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Editora Malheiros, 2013, p. 71.

[3]FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 65-66.

[4]GRUBBA, Leilane Serratine; DE OLIVEIRA, Juliana Pires. Contexto histórico, social e estrutural da discriminação das mulheres negras nas cidades brasileiras. Revista de Direito da Cidade, v. 14, n. 3, p. 1824-1854, 2022.

[5]FREITAS, Marcílio de. Amazônia e desenvolvimento sustentável: um diálogo que todos os brasileiros deveriam conhecer. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004, p. 173.

[6]MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. São Paulo: Editora Malheiros, 2013, p. 73.

[7]ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 21-26 e 279.

[8]NAÇÕES UNIDASDeclaração Universal dos Direitos Humanos, 1948. Disponível em: <https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos>. Acesso em: 20 abr. 2023.

[9]NAÇÕES UNIDAS. Declaração sobre Progresso Social e Desenvolvimento da Assembleia Geral da ONU. 1969. Disponível em: decl-progressodesenvsocial.pdf (ministeriopublico.pt). Acesso em: 20 abr. 2023.

 

[10]NAÇÕES UNIDAS. Declaração sobre o direito ao desenvolvimento. 1986. Disponível em: http://acnudh.org/wp-content/uploads/2012/08/Declara%C3%A7%C3%A3o- -sobre-o-Direito-ao-Desenvolvimento.pdf. Acesso em 20 abr.2023.

[11]FRASER, Nancy; BUTLER, Judiht. ¿Redistribución o reconocimiento? Um debate entre marxismo y feminismo. Madri: Editoria Traficante de Sueños, 2016.

 

[12]BOFF, Leonardo. Sustentabilidade: o que é: o que não é. Petrópolis: RJ: Vozes, 2015, p. 16.

[13]BARROS, Antônio Teixeira de. Agenda Verde Internacional e Seus Impactos no Brasil. Revista de Estudos e Pesquisas sobre a América. V.9. N2. 2015, p. 8.

[14]Ibid., p. 8.

[15]AMADO, Frederico Augusto Di Trindade. Direito Ambiental Esquematizado. São Paulo: Método, 2011, p. 542.

[16]Comissão Mundial Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Nosso Futuro Comum. 2ªed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas: 1991. p. 46. 

[17]Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Rio de Janeiro, junho de 1992. Rio Declaration, United Nations Conference on Environment and Development, Rio de Janeiro, Brasil, 3-14 de junho de 1992. Documento não traduzido oficialmente pela Organização das Nações Unidas.

[18]Agenda 21. Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. (1992: Rio de Janeiro). Tradução: Ministério das Relações Exteriores, Divisão do Meio Ambiente, com a colaboração do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações. Série Ação Parlamentar. 1995.

[19]AMADO, Frederico Augusto Di Trindade. Direito Ambiental Esquematizado. São Paulo: Método, 2011, p. 549.

[20]Declaração Oficial de Princípios, juridicamente não vinculativa para um consenso global sobre a gestão, conservação e desenvolvimento sustentável de todos os tipos de florestas. http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/a21_florestas.pdf. Acesso em 27.05.2023.

[21]Anexo ao Decreto n. 2.652, 1.07.1998. que promulga a Convenção-quadro das nações unidas sobre mudança do clima/mre. Decreto nº 2.652, de 1 de julho de 1998. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2652.htm.  Acesso em 27.05.2023.

[22]BARROS, Antônio Teixeira de. Agenda Verde Internacional e Seus Impactos no Brasil. Revista de Estudos e Pesquisas sobre a América. V.9. N2. 2015, p. 22.

[23]GUIMARÃES, Roberto; FONTOURA, Yuna. Desenvolvimento sustentável na Rio+ 20: discursos, avanços, retrocessos e novas perspectivas. Cadernos Ebape. BR, v. 10, p. 508-532, 2012, p. 514.

[25]Ibid., p. 521.

[26]GUIMARÃES, Roberto; FONTOURA, Yuna. Desenvolvimento sustentável na Rio+ 20: discursos, avanços, retrocessos e novas perspectivas. Cadernos Ebape. BR, v. 10, p. 508-532, 2012, p. 521.

[27]Ibid., p. 521.

[28]Ibid., p. 522.

[29]FREITAS, Marcílio de. Amazônia e desenvolvimento sustentável: um diálogo que todos os brasileiros deveriam conhecer. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004, p. 176.

[30]FERDINAND, Malcom. Uma ecologia decolonial: pensar a partir do mundo caribenho. São Paulo: Ubu Editora, 2022, p. 26.

[31]FERDINAND, Malcom. Uma ecologia decolonial: pensar a partir do mundo caribenho. São Paulo: Ubu Editora, 2022, p. 26-27.

[32]SOLÓN, Pablo. Alternativas sistêmicas: Bem Viver, decrescimento, comuns, ecofeminismo, direitos da Mãe Terra e desglobalização. Editora Elefante, 2019, p. 145.

[34]GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza: ética biocéntrica y políticas ambientales. Editorial Abya-Yala, 2015, p. 28.

[35]CAJIGAS-ROTUNDO, Juan Camilo. La biocolonialidad del poder. Amazonía, biodiversidad y ecocapitalismo. El giro decolonial: reflexiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global / compiladores Santiago Castro-Gómez y Ramón Grosfoguel. – Bogotá: Siglo del Hombre Editores; Universidad Central, Instituto de Estudios Sociales Contemporáneos y Pontificia Universidad Javeriana, Instituto Pensar, 2007, p. 170.

[37]Ibid., p. 47

[38]SHIVA, Vandana. Manifiesto para una democracia de la tierra: justicia, sostenibilidad y paz. Barcelona: Paidós, 2006, p. 11.

[39]ESTERMANN, Josef. Filosofía andina: Sabiduría indígena para un mundo nuevo. La Paz: ISEAT, 2006, p. 28.

[40]GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza: ética biocéntrica y políticas ambientales. Editorial Abya-Yala, 2015, p. 52-53.

[41]Ibid., p. 61-62.

[42]SOLÓN, Pablo. Alternativas sistêmicas: Bem Viver, decrescimento, comuns, ecofeminismo, direitos da Mãe Terra e desglobalização. Editora Elefante, 2019, p. 156.

[43]SOLÓN, Pablo. Alternativas sistêmicas: Bem Viver, decrescimento, comuns, ecofeminismo, direitos da Mãe Terra e desglobalização. Editora Elefante, 2019, p. 25.

[45]Ibid., p. 5 -6.

[46]Ibid., p. 6.

[47]ESTERMANN, Josef. Ecosofía andina: Un paradigma alternativo de convivencia cósmica y de Vivir Bien. Revista FAIA, v. 2, n. 9, p. 2-21, 2013, p. 7.

[48]Ibid., p. 7.

[49]Ibid., p. 7.

[50]Ibid., p. 7.

[51]Ibid., p. 7.

[53]Ibid., p. 8.

[54]Estermann estabelece o bem viver no seguinte sentido: a. É um conceito dinâmico. Descreve um processo contínuo; b. O conceito de ‘vida’ no contexto andino inclui tudo e excede em muito o puramente biológico. É, para falar na terminologia ocidental, um transcendental (transcendental). c. «Viver bem» tem como fundamento as categorias de sabedoria e filosofia andino. O princípio da relacionalidade é crucial, segundo o qual tudo está interligado com tudo. d. Qualquer alteração em termos de «melhoria» ou «deterioração» de uma situação, de um ser vivo, de uma transação, de qualquer ato ou qualidade de vida tem consequências para os aspectos correspondentes (complementaridade e correspondência) de outras entidades e «lugares» (topoi). e. «Viver bem» não é nem antropocêntrico nem androcêntrico, mas como um todo inclui o que é considerado fora da natureza humana: os ancestrais, os falecidos, as gerações futuras, o mundo espiritual e o divino; f. O “bem viver” dos Andes é baseado no ideal de equilíbrio cósmico ou harmonia universal (“justiça”), que se expressa em todos os níveis e aspectos. g. «Viver bem» no sentido andino não implica uma relação comparativa ou superlativa, o que teria como consequentemente, o princípio da aplicação universal (“globalizabilidade” ou “cosmabilidade”) deixaria de existir. h. A utopia andina de «viver bem» não é fruto da ideologia do progresso e do crescimento econômico ilimitado com base em uma compreensão linear do tempo. O «futuro real» encontra-se no «passado» que temos pela frente. ESTERMANN, Josef. Ecosofía andina: Un paradigma alternativo de convivencia cósmica y de Vivir Bien. Revista FAIA, v. 2, n. 9, p. 2-21, 2013, p. 10-11.

[56] 1.Consciência da finitude dos recursos naturais (minerais, água potável, terra, hidrocarbonetos, ar, biodiversidade, etc.) implica uma gestão econômica no sentido de uma “economia” original que é orientada em planeta Terra e o universo como o “lar” comum e único (oikos; wasi/uta) de todos os seres vivos e relacionamentos. 2. A «sustentabilidade» deve, portanto, ser entendida em um sentido cósmico e transgeracional. […]3. Na concepção andina, o ser humano não é em primeiro lugar «produtor» e «consumidor», mas «guardião» (arariwa) dos processos naturais de transformação e «participante» dos princípios cósmicos da complementaridade, correspondência e reciprocidade que tornam a vida possível e a preservam. 4. «Viver bem» e convivência no sentido andino são guiados pelos valores da «justiça cósmica» que se manifesta e atua como «equilíbrio» e «harmonia». […]5. […] Dentro e através trabalho, o ser humano ajuda a vida (no sentido cósmico) a se desenvolver e tornar possível uma nova vida. O trabalho é igualmente reprodutivo como ritual (espiritual) e, portanto, um empreendimento cultural. Em sentido estrito, só La pachamama (Mãe Terra) –e com ela as outras forças naturais– é produtiva; o ser humano é apenas seu “cultivador” (agricultor) e defensor. 6. Ecologia ou – melhor – ecosofia não é uma questão de “proteção ambiental”, mas um paradigma holístico de vida e economia em sintonia com as forças e a rede de relações do cosmos a concepção Andina do universo como um «organismo». […] 7. O sujeito das iniciativas e decisões políticas e econômicas não é o indivíduo (“cidadão” ou “consumidor”), mas a comunidade. Portanto, o titular de direitos não é, em primeira instância, a pessoa individual, mas o coletivo, a nação, o povo, mas também a terra (pachamama) e a água, o ar e o recursos naturais. 8. Para o «bem viver» andino e a ecosofia, o fato de os bens naturais como a água, a biodiversidade, as matérias-primas, a terra e o território eram propriedade de indivíduos ou empresas (ou seja: «propriedade privada»), é um tanto absurdo. O chamado «socialismo» ou comunitarismo andino não é e não se trata de uma ideologia marxista centrada no ocidente, mas de um modo de vida que deriva dos princípios fundamentais da pachasofia e ecosofia andina. 9. A concepção andina de «bem viver» e coexistência cósmica implica o acesso de todos os seres direitos aos bens básicos para sua existência (alimentação, saúde, educação, moradia), o de sua descendência e a vida do mundo não-humano. Em um mundo limitado, isso só é possível se um terço da a humanidade renuncia a sua abundância e desperdício e aceita uma contração da economia e uma “diminuição do bem-estar”. Um mundo onde todos adotariam um American Way of Life, não é apenas impossível, mas uma cegueira criminosa do modelo neoliberal vigente. O modelo atual da globalização neoliberal e consumista não é globalizável nem cosmicizável e menos compatível com o futuro gerações. 10. Para alcançar o ideal de «viver bem», não se trata em primeiro lugar da «criação» de riqueza, mas de uma distribuição e redistribuição justas dos ativos existentes. […] 11. O «socialismo democrático» promove uma transferência de bens e capitais de acordo com o princípio da solidariedade, reciprocidade e complementaridade, como prevê a ALBA (Alternativa Bolivariana para América Latina e Caribe) e o faz de forma incipiente. Em vez de promover o princípio da competição baseada no egoísmo individual e nacional, como defendido pelo capitalismo, o novo socialismo promove o antigo princípio do mutualismo (ajuda mútua e apoio mútuo). A consciência de «globalidade» e «interdependência» implica a urgência de que interesses e ideais também sejam entendidos como “global”, ou seja: cosmopolita, cosmo-econômico e cosmo-social. 12. Coexistência e re-habitação da Terra em sentido ecosófico, pressupostos pachasóficos da filosofia Andino, são construídos em Abya Yala lado a lado com uma profunda transformação da sociedade, no senso de interculturalidade e descolonização. A diversidade de formas de viver, culturas, modelos econômico e organizacional significa um diálogo aberto e “livre de dominação”, para projetar e construir nossa “casa comum”. Nem a ideia pós-moderna de espaços ou quartos (‘culturas’ ou ‘civilizações’) uns com os outros incomunicável, nem a ideia neoliberal globalizante de uma sala que determinaria a implementação e controle de os demais ambientes são compatíveis com o futuro da humanidade.[…] 13. O imperativo categórico de «viver bem» e da «coexistência cósmica» poderia ser o seguinte: “Agi sempre segundo a máxima segundo a qual uma vida humana digna (satisfação das necessidades básicas; autodeterminação social, política e cultural; respeito e igualdade de oportunidades) pode ser garantida para todos os seres humanos no presente e no futuro e que garante ao mesmo tempo a sobrevivência do planeta Terra. E isso significa que uma política e uma economia correspondentes devem ser compatíveis com os cosmos, as gerações futuras, o mundo espiritual e religioso, a diversidade cultural e, sobretudo, os pobres. 14. Finalmente, “viver bem” e coexistência ecosófica implicam um reordenamento fundamental das relações de poder, no sentido da equidade de gênero e superação do patriarcado e do androcentrismo. Todo tipo de superioridade devido ao poder, riqueza, estruturas herdadas ou legitimação biológica (racismo), não é compatível com “viver bem”. E isso, por sua vez, implica também uma profunda desconstrução da tradição filosófica dominante, em termos de interculturalidade e gênero. ESTERMANN, Josef. Ecosofia andina: Un paradigma alternativo de convivencia cósmica y de Vivir Bien. Revista FAIA, v. 2, n. 9, p. 2-21, 2013, p. 11-13.

 

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